O filósofo Sêneca dizia que “a sorte é o que acontece quando a preparação encontra a oportunidade”. No mundo dos investimentos, essa preparação exige mais do que entusiasmo com números bonitos de retorno: pede a disciplina de analisar cenários. E não apenas o cenário otimista, aquele em que tudo dá certo. O erro mais comum dos investidores é acreditar que o futuro será apenas a extensão do presente, sem considerar o que pode sair do script.
Quando alguém olha apenas para o melhor resultado possível, tende a se expor mais do que deveria. Imagine a empolgação com a ação de uma empresa que, sozinha, produz um equipamento de alta demanda. O raciocínio imediato é: quanto mais vende, mais lucra, e como parte dos custos é fixa, a margem sobe ainda mais. Parece irresistível.
Mas margens elevadas atraem concorrentes, e, com novos entrantes, o mercado se divide, as margens caem e os lucros projetados desaparecem. O investidor que só olhou para o cenário otimista pode se ver preso em uma aposta que não correspondeu à expectativa.
Mais grave ainda é quando o investidor despreza cenários de baixa probabilidade. Imagine uma análise em que se descobre que, com apenas 10% de probabilidade, um investimento pode gerar uma perda de 50%. Muitos descartam esse resultado por considerá-lo improvável.
Mas a questão central não é se esse cenário vai se concretizar, e, sim, o que acontece se ele ocorrer. Será que, diante de uma perda tão significativa, a exposição inicial faria sentido? Normalmente, não. Por isso, mesmo cenários pouco prováveis precisam entrar no cálculo. Eles servem para ajustar o tamanho da aposta, evitando que um único revés comprometa todo o patrimônio.
Esse raciocínio vale também para a renda fixa. Quem investe em prefixados hoje, por exemplo, costuma apostar na queda dos juros. Se isso acontecer, o título valoriza. Mas e se os juros não caírem como o esperado? Pior, e se subirem? Nesse caso, o investidor fica preso a um papel que pode render menos que o CDI ou a Selic, carregando uma posição que poderia ter sido calibrada se tivesse considerado um cenário alternativo.
O mesmo se aplica a títulos indexados à inflação. Apostar que ela ficará baixa pode parecer lógico agora, mas e se subir mais rápido do que o esperado? O resultado pode frustrar quem não simulou esse desfecho.
Analisar cenários é, no fundo, um exercício de humildade. É admitir que o futuro é incerto e que não temos controle sobre todas as variáveis. Profissionais de mercado, como bancos centrais e grandes gestoras, sempre trabalham com cenários base, otimista e pessimista, atribuindo probabilidades a cada um deles. Mais importante do que acertar a previsão é calibrar a exposição de acordo com as consequências possíveis.
Investir sem fazer esse exercício é como viajar levando apenas roupas de verão porque, no dia da partida, o sol está brilhando. O problema é que o clima pode mudar, e o desconforto pode ser grande. A mesma lógica vale para os investimentos: se preparar para diferentes climas não elimina os riscos, mas reduz a chance de ser pego desprevenido.
Portanto, antes de aplicar seu dinheiro, pergunte-se: que cenários estou considerando? E se o improvável acontecer, qual será o tamanho da minha perda? Estarei disposto a aceitá-la? Essa é a verdadeira preparação de que Sêneca falava. A sorte, se aparecer, será apenas consequência.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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