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24 de agosto de 2025 01:22

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Escrever é verbo que briga com o sujeito – 20/08/2025 – Sérgio Rodrigues

A literatura cria à medida que é escrita as regras pelas quais exigirá ser lida. É por isso que o terreno nunca vai estar inteiramente mapeado; o risco é parte inseparável do jogo. Se há algo de “universal” aí, é negativo: uma permanente insatisfação parece ser comum a gente de variadas épocas e escolas.

O raciocínio não se aplica a quem lida com a linguagem como mero instrumento. “Profissionais do texto” que miram um objeto existente fora do mundo da linguagem podem se sentir plenos ao informar, relatar, dissertar, argumentar, resumir, requerer, inventariar etc. Não por acaso, são essas as funções da escrita em que a IA já se tornou competente.

Na escrita criativa não se tem a mesma sorte. A insatisfação eterna sugere um ajuste precário entre sujeito e verbo, “escritor” e “escrever”. É provável que exista um núcleo disfuncional em tudo isso, aquilo que bota o motor para rodar.

Qualquer que seja o fenômeno psíquico que leva alguém à escrita, será informação de interesse para quem escreve, mas irrelevante para quem lê. O propósito terapêutico que possa ser extraído do conhecimento da ferida anímica que provoca o texto não importa no mundo do texto.

O propósito estético da escrita literária não é apenas desvinculado de seu eventual propósito clínico; é, em certo sentido, o contrário dele. Olha para o lado oposto: para fora do sujeito, para o mundo das palavras.

Então os escritores são todos uns neuróticos? O romancista americano E.L. Doctorow tem uma frase famosa que sugere distúrbio mais grave: “Escrever é uma forma socialmente aceita de esquizofrenia”. Nesse ponto cabe ter cautela. Como metáfora, a coisa tem sua utilidade –quem escreve pode mesmo “ouvir” vozes dentro da cabeça.

Contudo, deve-se evitar a tentação de associar arte e loucura para dar ares malditos, heroicos, messiânicos ou mágicos ao que é apenas deformação profissional, boca torta do cachimbo.

Embora possa parecer, nada disso tem a ver com uma visão romântica da literatura. Escrever é só um ofício entre tantos, mas em certos aspectos não se assemelha a nenhum outro –o que é natural.

Cada tipo de trabalho tem suas peculiaridades, como sabem o vigia noturno que aprende a cochilar sem pregar o olho e a bailarina clássica que evita calçar sandálias abertas para não exibir os pés castigados na dolorosa disciplina da leveza.

Não é por esoterismo, frescura ou doença mental que escritores são eternos insatisfeitos. É que em seu trabalho a linguagem, além de meio, é princípio e fim. Mais até: é drama, palco, cenário, elenco, plateia, bilheteria, a rua onde se situa o teatro, a cidade em volta da rua, o país em volta da cidade e por aí vai.

Batalha que se perde de saída. Implosão e explosão ao mesmo tempo. Um disparate. Arte.

Na próxima terça, dia 26, às 19h, lanço em São Paulo meu novo livro, “Escrever é humano”, em conversa com o escritor Reinaldo Moraes na Livraria da Travessa de Pinheiros. Todo mundo convidado!


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