Ser filha de um artista tão admirado e aplaudido também é um desafio. Há cobranças, comparações, expectativas, especialmente quando se escolhe o mesmo caminho da arte. Preta assumiu esse risco. Não seguiu o mesmo estilo musical do pai, encarou as críticas por não ter a mesma densidade e os ímpetos de novidade dele.
Preferiu fazer música pop dançante e alegre, que também a vincula ao seu berço, onde aprendeu o amor ao palco, à comunicação com o público, a fé na festa, a entrega ao carnaval, e a assumir a missão generosa de quem canta com verdade.
Mulher preta, fora do padrão estético imposto por estruturas machistas, racistas e gordofóbicas, ela assumiu sua autenticidade com firmeza e liberdade. Ofereceu arte a um país que tantas vezes lhe lançou pedras. Uma presença engajada, feita com cara, voz e carisma, cobrando respeito e dignidade.
Mesmo sendo uma estrela desde criança, experimentou os dramas humanos, como a separação dos pais e a partida precoce do irmão, e viveu os tormentos comuns às mulheres comuns do Brasil: críticas ao corpo, ataques à cor da pele, ameaças pela liberdade, traição e abandono de quem amava quando mais precisou. Essas violências foram menores que a rede de amor e solidariedade que a cercou: família, amigos, fãs e gente distante que se reconheceu na verdade das suas atitudes.
Na doença, manteve o propósito de inspirar, sendo sempre transparente e mantendo a fé e a gratidão. Foi, talvez, a primeira artista brasileira a se deixar fotografar com uma bolsa de colostomia, enfrentando os estigmas. Mais do que isso: mostrou que é possível viver plenamente mesmo diante das limitações do corpo e da doença. Com a bolsa, mergulhou na piscina e no mar, cantou, fez carnaval. Encorajou milhares de pessoas ao dizer, com o exemplo, que é possível.
O Brasil torceu por sua recuperação como quem torce por um futuro com menos preconceito e mais diversidade.